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Blog de Tabatinga

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#Folclore - O povo pescado por Yoi


Tetchi arü ngu’ü jogou a borra do jenipapo no igarapé Evare. Depois essa borra apareceu transformada em piracema. Yoi tinha feito um cercado no igarapé, para esperar a piracema. Ele sabia que Ipi iria aparecer também e queria pescá-lo. E ficava todos os dias sentado no porto à espera do Ipi. Em casa, Tetchi arü ngu’ü sempre se lamentava com seu filho: Tenho muita saudade de seu tio Ipi. Quando ele estava vivo nada nos faltava. Sempre tinha comida em casa. Yoi nunca traz nada para a gente comer. Yoi, quando ia para casa, se disfarçava, ficava bem pequeno e por isso escutava tudo o que a mulher dizia. Então, resolveu perguntar a ela: Você tem muita saudade de Ipi? Você estava falando o nome dele.

Eu não falei o nome de Ipi. Falei que queria cantar o seu nome, Yoi - disse Tetchi arü ngu’ü. Nada, você falou o nome do Ipi - continuou Yoi. Se você falou mesmo o nome dele, amanhã nós vamos pegar uma vara de anzol para pescá-lo. No dia seguinte, foi até o igarapé para ver se os peixinhos tinham aparecido. Viu muitos peixes. Tetchi arü ngu’ü também estava ali. Yoi queria pescar aqueles peixes para que eles se transformassem em gente. Queria pescar o seu povo. Foi então buscar urna fruta de tucumã para usar como isca. Mas com a fruta de tucumã ele não conseguiu pescar gente. Os peixes se transformavam em animais. Pegou queixada, porco do mato, todos com seu par, sempre macho e fêmea. Vieram muitos animais. Então Yoi pensou que para pescar gente ele precisaria arranjar uma outra isca. Aí experimentou com macaxeira e os peixes que saiam logo se transformavam em gente. Assim pescou muita, muita gente. Seu
irmão, porém, não apareceu entre esse pessoal. Foi então que ele viu um peixinho com uma mancha de ouro no nariz. Sabia que aquele era Ipi. Tentou pescá-lo, mas Ipi não pegava sua isca. Aí disse Yoi para Tetchi arü ngu’ü: Tome o anzol. Venha pegar o seu macho. Antes de Tetchi arü ngu’ü encostar o anzol na água, o peixinho pulou e pegou a isca. Saltou para terra e virou gente. Era Ipi. Ele falou: lá embaixo de onde eu venho tem muita mina, muito ouro. Eu quero voltar para lá.

Está bem, mas agora você vai pescar o seu povo - disse Yoi. Ipi pescou muita gente, mas eram todos peruanos. E aqueles que Yoi tinha pescado eram os Ticuna mesmo. Eram o povo Magüta. Do resto da borra do jenipapo, Yoi pescou os negros. Depois da pescaria estavam todos juntos. Yoi, então, resolveu virar o mundo, porque ele queria ficar para baixo, para o lado em que o sol nasce. Ipi não viu a hora em que o irmão fez essa virada. Se foi, pensando que seguia para baixo. Quando viu que estava no lado de cima, já não podia mais voltar.

Eles só foram embora mesmo depois da festa. O pessoal da festa disse: Agora já não tem mais Yoi nem Ipi no Evare. Um dia, Yoi pensou como poderia fazer para que cada pessoa tivesse sua nação. Até aquele dia só existia uma única nação e as pessoas não podiam se casar entre elas. Ele já sabia como deveria fazer, mas perguntou a Ipi. Ipi também já sabia e logo foi dizendo: Então, meu irmão, vamos matar uma jacarerana para conhecer a nação do pessoal? Yoi concordou e eles logo acharam e mataram urna jacarerana. Cortaram o animal em pedacinhos e colocaram num pote bem grande para ferver. Quando estava cozido, chamaram o pessoal para beber. Numa colher de pau, Yoi dava a cada pessoa um pouco daquele caldo. Os primeiros que tomaram receberam a nação de onça. Cada pessoa que bebia ia embora, ficava longe dos outros. Depois da nação de onça, veio a de saúba. O pessoal bebia e logo sabia sua nação. Ah! Esse caldo está azedo, é da nação de mutum - falou uma das pessoas. Beberam até que se criaram todas as nações que existem hoje.

(In OLIVEIRA FILHO, 1988, 90-105. I disegni sono opera degli stessi Ticuna)


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