Tetchi arü ngu’ü jogou
a borra do jenipapo no igarapé Evare. Depois essa borra apareceu transformada
em piracema. Yoi tinha feito um cercado no igarapé, para esperar a piracema.
Ele sabia que Ipi iria aparecer também e queria pescá-lo. E ficava todos os
dias sentado no porto à espera
do Ipi. Em casa, Tetchi arü ngu’ü sempre se lamentava com seu filho: Tenho muita saudade de seu tio Ipi. Quando
ele estava vivo nada nos faltava. Sempre tinha comida em casa. Yoi nunca traz
nada para a gente comer. Yoi, quando ia para casa, se disfarçava, ficava
bem pequeno e por isso escutava tudo o que a mulher dizia. Então, resolveu
perguntar a ela: Você tem muita saudade
de Ipi? Você estava falando o nome dele.
Eu não falei o nome de Ipi. Falei que queria cantar
o seu nome, Yoi - disse
Tetchi arü ngu’ü. Nada, você falou o nome
do Ipi - continuou Yoi. Se você falou
mesmo o nome dele, amanhã nós vamos pegar uma vara de anzol para pescá-lo. No
dia seguinte, foi até o igarapé para ver se os peixinhos já tinham aparecido. Viu muitos
peixes. Tetchi arü ngu’ü também estava ali. Yoi queria pescar aqueles peixes
para que eles se transformassem em gente. Queria pescar o seu povo. Foi então
buscar urna fruta de tucumã para usar como isca. Mas com a fruta de tucumã ele não conseguiu pescar gente. Os
peixes se transformavam em animais. Pegou queixada, porco do mato, todos com
seu par, sempre macho e fêmea. Vieram muitos animais. Então Yoi pensou que para
pescar gente ele precisaria arranjar uma outra isca. Aí experimentou com macaxeira
e os peixes que saiam logo se transformavam em gente. Assim pescou muita, muita
gente. Seu
irmão, porém, não apareceu entre esse pessoal. Foi então que ele viu um peixinho com uma mancha de
ouro no nariz. Sabia que aquele era Ipi. Tentou pescá-lo, mas Ipi não pegava
sua isca. Aí disse Yoi para Tetchi arü ngu’ü: Tome o anzol. Venha pegar o seu macho. Antes de Tetchi arü ngu’ü
encostar o anzol na água, o peixinho pulou e pegou a isca. Saltou para terra e
virou gente. Era Ipi. Ele falou: lá
embaixo de onde eu venho tem muita mina, muito ouro. Eu quero voltar para lá.
Está bem, mas agora você vai pescar o seu povo - disse Yoi. Ipi pescou muita gente, mas eram
todos peruanos. E aqueles que Yoi tinha pescado eram os Ticuna mesmo. Eram o
povo Magüta. Do resto da borra do jenipapo, Yoi pescou os negros. Depois da
pescaria estavam todos juntos. Yoi, então, resolveu virar o mundo, porque ele
queria ficar para baixo, para o lado em que o sol nasce. Ipi não viu a hora em
que o irmão fez essa virada. Se foi, pensando que seguia para baixo. Quando viu
que estava no lado de cima, já não podia mais voltar.
Eles só foram embora mesmo depois da festa. O pessoal da festa disse: Agora já não tem mais Yoi nem Ipi no Evare. Um
dia, Yoi pensou como poderia fazer para que cada pessoa tivesse sua nação. Até
aquele dia só existia uma única nação e as pessoas não podiam se casar entre
elas. Ele já sabia como deveria fazer, mas perguntou a Ipi. Ipi também já sabia
e logo foi dizendo: Então, meu irmão,
vamos matar uma jacarerana para conhecer a nação do pessoal? Yoi concordou
e eles logo acharam e mataram urna jacarerana. Cortaram o animal em pedacinhos
e colocaram num pote bem grande para ferver. Quando já estava cozido, chamaram o pessoal para beber. Numa colher de
pau, Yoi dava a cada pessoa um pouco daquele caldo. Os primeiros que tomaram
receberam a nação de onça. Cada pessoa que bebia ia embora, ficava longe dos
outros. Depois da nação de onça, veio a de saúba. O pessoal bebia e logo sabia sua nação. Ah! Esse caldo está azedo, é da nação de mutum - falou uma das
pessoas. Beberam até que se criaram todas as nações que existem hoje.
(In OLIVEIRA FILHO, 1988, 90-105. I
disegni sono opera degli stessi Ticuna)
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