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Blog de Tabatinga

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#Amazônia - Um histórico de resistência e luta

27/10/2015, terça-feira

Foto: Blog Crônicas do Pirarucu


A Amazônia é hoje um imenso palco, onde concorrem interesses, visões, culturas e projetos dos mais distintos. Historicamente, a floresta sempre foi encarada pelo Brasil "desenvolvido" como região periférica, de gente e solo pobres, porém, também como uma promessa, território de diversas riquezas exploráveis. Nela, formaram-se feudos e senhores feudais, desde grileiros até os modernos representantes do agronegócio da soja e do gado – uns à margem da lei, outros amparados por um Estado benevolente. De outro lado, os povos da floresta – entre índios, trabalhadores rurais, seringueiros, quilombolas e outros – têm um histórico de resistência e luta para se afirmarem e permanecerem em seus territórios, garantindo direitos sociais básicos, quase sempre negados. Nesse caldeirão, aparecem alguns atores especiais, como os militares, movimentos sociais, ONGs nacionais e estrangeiras, ambientalistas, entidades de pesquisa, corporações estrangeiras, crime organizado, cada qual com seus propósitos.

Nas clareiras da floresta, uma população urbana crescente, já maior que a rural, vivencia cada vez mais os problemas e impasses tradicionais associados à urbanidade tardia e desordenada. A condição de periferia fez do Estado algo historicamente ausente e omisso na região. Governos locais, legislativo e judiciário, quase sempre foram empossados por representantes das castas superiores, não se comprometendo com o desenvolvimento local e com a distribuição justa das riquezas. O resultado é amplamente conhecido: conflitos sangrentos, massacre de índios e trabalhadores pobres, desmatamento, exploração ilegal de recursos naturais, biopirataria, etc. Mas todo esse atraso político não é decerto um defeito genético de sua gente: se as instituições estatais não funcionam, se as leis de proteção aos direitos humanos e à natureza não são aplicadas na prática, isso sempre foi convenientemente perpetuado a fim de servir a interesses particulares, tanto da elite local como de fora, ávidas por explorar sem escrúpulos e sem as amarras da lei.

Mas qual a importância dessa terra subdesenvolvida? Quantos não são as regiões do planeta atrasadas como essa, cujos problemas não importam a quase ninguém? O fato é que, por ironia, em tempos de crise ambiental, energética e econômica, os olhos do mundo se voltam para a antes relegada Amazônia. Na verdade, suas questões se remetem a um debate maior, no qual se trava uma disputa de visões e modelos opostos para o mundo.

Enquanto a selva amazônica segue seu curso de degradação acelerada, existe outra selva, que avança e se impõe em todos os cantos do planeta. Esta selva, cujo nome é neoliberalismo, foi imposta como a ordem mundial contemporânea. De forma quase religiosa, seus ideólogos – os chamados especialistas e formadores de opinião – anunciam que a História acabou, isto é, não poderia haver alternativas para esse modelo. Embora desdenhem de quase tudo aquilo que dizem os cientistas acerca da crise ambiental, recortam da biologia a idéia que lhes convém para justificar sua ideologia: o homem é um ser competitivo e sua lei é a lei da selva. Em seu darwinismo social, reduzem o ser humano a uma máquina biológica alienada, desprovida de razão, moral e crítica, e o eximem de responsabilidade sobre a estrutura econômica e social da qual faz parte.

Como dizia o geógrafo Milton Santos, o consumismo é a religião fundamentalista da nossa época. Essa religião possui sua simbologia, templos e sacerdotes, representados pelas marcas, pelas modernas corporações, pelo onipresente marketing, shopping centers, celebridades, etc. Através dela, o ato de consumir foi elevado ao status de suprema felicidade humana. No entanto, para sustentá-la criamos um modelo econômico insustentável e predatório, cujo motor é o lucro. Tudo é justificado pela lógica do capital e das sacras leis de mercado. Embora sua dinâmica perversa gere terríveis consequências sociais e ambientais, elas são apresentadas como lamentável fatalidade do chamado "mundo moderno", como se fossem desígnio divino ou obra da natureza. No entanto, esse modelo tem seus beneficiários e seus guardiões. Esse modelo foi resultado de escolhas humanas, fruto de um processo histórico. Com efeito, por mais que alguns queiram dizer o contrário, a História ainda teima em seguir seu rumo, o qual, querendo ou não, depende de todos nós. Para citar também o humanista Leornardo Boff - no sentido inverso ao velho adágio capitalista -, a crise é também um momento de oportunidades.

Texto publicado originalmente no Blog Crônicas do Pirarucu

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